Hermético?

Hermético: adj. 1. Inteiramente fechado, de sorte que o ar não possa entrar. 2. De compreensão muito difícil.

Quão difícil será invadir-me o Ar a abertura piriforme? E quem disse que o quero percorrendo o epitélio mucoso que reveste as minhas vias respiratórias? Talvez sua ausência me leve ao ébrio estado de lucidez tão desejado por aqueles de pulmões obliquamente vulneráveis. Creia! Do Ar anseio apenas a força para gritar. Desejo a necessidade orgânica de contrair meu diafragma e distender as minhas valéculas epiglóticas, contrair as minhas cordas vocais e relaxar o meu centro tendíneo em ritmos espásticos para sentir propulsões nos hiatos esofágico e aórtico. Apenas desejo o grito!
E de que me valeria sobrecarregar de forma absurda minha medula oblonga e meu nervo frênico se o quadríceps da coxa e flexor longo do hálux não acompanham tanta necessidade de aminas endógenas? Por que exigir tanto dos meus sarcômeros se a glicogenólise e a vasoldilatação simpática não serão satisfatórias?
Por isso opto pela Hipoxia. Uma acidose metabólica não faz tão mal assim. Em certos instantes é até preferível. É o suficiente para aturdir um pouco a hemodinâmica das minhas hemácias. E a escolho pois neste meu estado letárgico não me é necessário lembrar que onírica é a segurança fora da camada córnea que reveste meu corpo. Escolho com avidez na vaga esperança de que a ausência do Ar me faça perder a indispensável prudência, a qual prefiro ignorar quando utilizo exaustivamente as minhas áreas de Broca e Wernick e esqueço que devo abusar do meu Órgão de Corti e fingir não possuir músculo hipoglosso.
Apenas a Hipoxia! - na ânsia de que ela me seja amiga e imobilize meu Circuito de Papez, que parece ter sido fadado à incoerência e à tolice, ao ponto de me propiciar liberação de serotonina quando escrevo textos prolixos ou dedico horas a fio estudando os processos neurofisiológicos que tentam explicar por quê ser humano é tão hermeticamente divino.

- Loucura de um estudante de Medicina -

quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Proposta

Dispoto espero eu que de onde estás se levante!
Foi-me eterno o tempo em que estiveras distante.
Triste é tua ausência! - E por tal dor te convido:
Anda. Adianta. Ficar já não faz sentido.

Não importa por quanto estarás ao meu lado
(Se ao Hoje ou se ao Sempre) - Sei que a ti fui fadado.
Este é o nosso destino. Fugir? - Não mais tente
Deita. Descansa. E adormece em meus braços quentes.

Esquece os receios. Ansioso eu te aguardo.
- Pode em ti o medo ser força ou lívido fardo -
O meu eu-infinito é o que - em paz! - te ofereço;

Mesmo que tudo ainda seja ignoto e obscuro
Eu, de certo, outra vez bem tranquilo asseguro:
Volta! - E será um leve e cálido recomeço.

Refael Casal
30 de Setembro de 2009

terça-feira, 28 de julho de 2009

Algo Sobre o Que Descobri Há Pouco

Foi-se o Tempo! ̶ E, com ele, o amor nosso hediondo!
Com cuidado, entre os versos, verdade hoje escondo:
O sorriso (do qual, com o vazio em mim cismo)
Perdi para o meu tão venéfico egoísmo.


Foi-se o Tempo! ̶ E, agora, hígidos eu nos vejo!
Quanto ao tudo? ̶ Ora, eu sei, foi inefável desejo.
Mas sequer tive o tino que amar me exigia...

̶Condenado assim fui a inócua nostalgia ̶

Foi-se o Tempo! ̶ E, enfim, a inventar nada existe!
Nem morte, nem vida: só a ultriz saudade triste
É o que tenho! E as lembranças, sim, são todas minhas.

Já não guardo ima dor! ̶ Ela, eu sei: Tu condenas!
E aos olhos silentes resta ̶ incólume ̶ apenas
A certeza que a mim destes tudo que tinhas.

Rafael Casal
28 de Julho de 2009

quarta-feira, 3 de junho de 2009

Álibi

Fim de jogo! – E, agora, posso apenas te impor
Da pólvora a textura e do sangue o sabor.
Sufoque o choro que à morte fada a cabeça!
Quanto ao beijo não dado? – Arrependa-se e esqueça.

Dolosa é a sentença! − (Bem mais do que eu supunha!)
Sim! Creia: de sonhos já não sou testemunha.
Trago, pois, das verdades que –em mim!– sempre mato
Na roupa o resquício de edaz assassinato.

Se te é ilícito o crime: armas suas recolha!
− Felicidade é também questão de ima escolha –
Eu confesso: Acabou! – Quero a dor que degrade.

Não tenho culpa! − E tal prova é o que me compraz
Pois quando – incauto – perdeste, em ti mesmo, a paz
Longe eu estava, em busca da tranquilidade.

Rafael Casal
03 de Julho de 2009