Hermético?

Hermético: adj. 1. Inteiramente fechado, de sorte que o ar não possa entrar. 2. De compreensão muito difícil.

Quão difícil será invadir-me o Ar a abertura piriforme? E quem disse que o quero percorrendo o epitélio mucoso que reveste as minhas vias respiratórias? Talvez sua ausência me leve ao ébrio estado de lucidez tão desejado por aqueles de pulmões obliquamente vulneráveis. Creia! Do Ar anseio apenas a força para gritar. Desejo a necessidade orgânica de contrair meu diafragma e distender as minhas valéculas epiglóticas, contrair as minhas cordas vocais e relaxar o meu centro tendíneo em ritmos espásticos para sentir propulsões nos hiatos esofágico e aórtico. Apenas desejo o grito!
E de que me valeria sobrecarregar de forma absurda minha medula oblonga e meu nervo frênico se o quadríceps da coxa e flexor longo do hálux não acompanham tanta necessidade de aminas endógenas? Por que exigir tanto dos meus sarcômeros se a glicogenólise e a vasoldilatação simpática não serão satisfatórias?
Por isso opto pela Hipoxia. Uma acidose metabólica não faz tão mal assim. Em certos instantes é até preferível. É o suficiente para aturdir um pouco a hemodinâmica das minhas hemácias. E a escolho pois neste meu estado letárgico não me é necessário lembrar que onírica é a segurança fora da camada córnea que reveste meu corpo. Escolho com avidez na vaga esperança de que a ausência do Ar me faça perder a indispensável prudência, a qual prefiro ignorar quando utilizo exaustivamente as minhas áreas de Broca e Wernick e esqueço que devo abusar do meu Órgão de Corti e fingir não possuir músculo hipoglosso.
Apenas a Hipoxia! - na ânsia de que ela me seja amiga e imobilize meu Circuito de Papez, que parece ter sido fadado à incoerência e à tolice, ao ponto de me propiciar liberação de serotonina quando escrevo textos prolixos ou dedico horas a fio estudando os processos neurofisiológicos que tentam explicar por quê ser humano é tão hermeticamente divino.

- Loucura de um estudante de Medicina -

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Onde estão as canetas?

O silêncio dos punhos minh'alma traspassa
Faltar-me a palavra? - Que isto o amor não permita!
Quando a tinta me é decrépita e escassa
Necessário se torna o meu sangue à escrita.

Onde estão as canetas? - De urgência as procuro!
- Busco a essência dos traços luzidios do escuro -
Aos tácitos símbolos contraste acrescento
E o pálido papel? - Permanece alvacento.

Da inspiração A ausência não é o que me afeta:
Fátua história não ter? - Maior dor de um poeta
- Vivo, enfim, o vazio de que outrora eu fugia!

Brandíloquo nada é o meu futuro aziago
E ao ubíquo destino nas mãos sempre trago
Folhas em branco manchadas de nostalgia.

Rafael Casal
27 de Fevereiro de 2009

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Caixa de Música

Dança ao som da saudade! Oh, meiga Bailarina
- Transitória frequência é o que os teus pés domina -
Protege em segredo a minha voz inaudita,
Quanto as jóias silentes? - Apenas reflita.

Dança sempre o meu canto! - Afônico eu te imploro
Sente, à pele, o sinal: Ele não é sonoro!
Como a ti são os gritos que a paz escondia
Pode ser o silêncio também melodia.

Viva os timbres suaves que a dor arrebata,
No ritmo hipnótico desta muda sonata
Permanece - em surdina - guardada e esperança!

Áfona sinfonia ao teu corpo eu orquestro
Siga o tom da canção! - Ele é o nosso maestro
E se adverso é o fim: Aquieta-te e dança...

Rafael Casal
17 de Fevereiro de 2009

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

A Sabedoria da Lembrança

Inconcussa memória aos meus olhos se lança
- Mesmo que a idade amiga me seja funesta! -
Quando a pele revela - dos pés - a herança
Lacônica saudade é o que, às mãos, sempre resta.

Pelo julgo da vida que é suave e manso
Entrego-me, criança, aos meus fardos de homem!
Na alma anacrônica da morte eu descanso
Apesar das dores que as idéias consomem.

Abraço o destino! - Logo então me aquieto
E ao sentir, do passado, o vazio dileto
De altenosas lembranças o amor reinvento;

Agarro-me ao tempo! - Exímio ele é no que faz
Sem, contudo, inumar cada instante fugaz
Pois lembrar de esquecer é não ter sentimento.

Rafael Casal
11 de Fevereiro de 2009

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

Convite

Vem! Esta é a hora de viver o futuro
Com audácia, aos teus pés, o caminho revelo!
Entre opíparas flores ainda procuro
A natureza egrégia de beijos singelos.

Abandone, ególatra, este escuro abafante!
- Resvaladiço é esperar um céu que te encante -
Quando o Sol de nascer - intrépido! - se esqueça
Criaremos razão que ilumine a cabeça.

Vem! Hilário infinito, hojé, é o nosso limite!
Segue-me veloz para que nós -lauta - habite
A coragem de Amar que a saudade aniquila;

Apressa a encontrar-me! - Pois ficar já não posso
E ao fazê-lo, enfim, insólito será nosso
O inefável prazer de uma vida tranquila!

Rafael Casal
06 de Fevereiro de 2009

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Tributo Eloquente

Verde é a esperança que em meu corpo renasce
Como verde é o olhar que ilumina tua face!
Teu sorriso me pode lenir o que é triste
Sou feliz pelo amor que, entre nós, cauto existe.

Firme agarro em tuas mãos! - Todo nosso é o trajeto
- Em teus braços suspenso o universo arquiteto -
Quanto seja de vida que em ti deposito
Maior será a morte em meu íntimo infinito.

Comigo estarás! - Mesmo que o tempo nos fade
Ao breve ou - quem sabe! - por sorte à idade
Em que a alma envelhece e a matéria atrofia;

Cada parte de ti em meu ser reconheço
E hoje, aos céus, grato sou por teu íntegro apreço
Bevemérita amiga: Menina Sofia!

Rafael Casal
02 de Fevereiro de 2009

domingo, 1 de fevereiro de 2009

Viagem

Raízes arrancar? - Sem qualquer medo o faço!
De asas necessito e - urgente - me é obtê-las.
Busco, ao dia, o valor de profícuo cansaço
E, à noite, o imagético brilho das estrelas.

Além do infinito vejo a paz prometida,
Obsoleto latíbulo a transpor me ordeno!
Devo sedento entregar-me aos vinhos da vida
E do mundo provar todo abjeto veneno.

Rasgo as vestes e, enfim, às máscaras me atento
- No corpo suado anseio o beijo do vento! -
Carregam-me os pés às alegrias sinceras.

De prolixo ilogismo eu - atroz - me liberto!
E, ao fechar as portas, de uma coisa estou certo:
Lá fora, intacta, a felicidade me espera...

Rafael Casal
01 de Fevereiro de 2009